o poder simbólico é vivenciado, no dia-a-dia das escolas, por atores que procuram transformar em capital simbólico as outras espécies de capital que possuem, no sentido de "ganhar" as pessoas, para poderem contar com elas: os administradores e especialistas, detentores de cargos de maior poder hierárquico e de maior capital cultural expresso em títulos escolares, transformam este capital em moedas de competência e habilidades que vão lhes permitir o exercício do poder simbólico na escola. Enquanto funcionários e colegas de serviço de seus subordinados, com quem dividem os bancos do ônibus ou com quem compartilham seu carro, utilizam, inconscientemente, suas qualidades pessoais e sua habilidade de relacio-namento para ganhá-los como adeptos na luta velada pela imposição de idéias.
Em meio às orientações de supervisores e administradores, à preocupação com o cumprimento dos programas, à freqüência às reuniões constantes, à preparação de aulas e correção de trabalhos e ao atendimento aos pais de alunos, os professores recebem o reflexo e refletem as relações de poder existentes. Elementos-chave dos contatos da instituição, os professores têm muito mais poder dentro da escola do que podem, sequer, imaginar.
Os funcionários administrativos, muitas vezes recrutados entre os próprios professores e membros de confiança da administração, participam das relações de poder existentes de forma pouco questionadora. Mais próximos dos administradores do que dos docentes constituem-se, muitas vezes, em seus mais fiéis colaboradores, sendo alvos fáceis do exercício do poder simbólico.
Os funcionários de serviço, ocupantes de posição hierárquica inferior, membros um tanto isolados das inter-relações estabelecidas na instituição e das decisões mais importantes, têm como maiores interlocutores colegas da própria categoria e participam, como coniventes, das relações de poder instauradas, vivendo e convivendo conforme a ordem estabelecida, considerando-a como legítima.
Os alunos, considerados por todos como a razão de ser da escola, são os alvos dos reflexos das relações de poder existentes: vítimas do mau humor de professores descontentes ou contemplados pela sorte de conviver com mestres satisfeitos e adaptados, sofrem mais diretamente as conseqüências do clima estabelecido na instituição.
Os pais e líderes comunitários das escolas de periferia, muito mais esclarecidos e envolvidos com a questão da escola do que se podia esperar em razão de seu parco capital econômico, social e cultural, são forças à parte, com as quais a administração da escola pode contar, se se empenhar em conquistá-las. Falta às equipes das escolas maior empenho em envolver as lideranças comunitárias em suas atividades.
Os Inspetores Escolares, elementos de ligação entre a escola e os órgãos administrativos do sistema, precisam marcar mais sua presença nas escolas que orientam. Mantendo relações, apenas, com administradores e funcionários administrativos, deixam de conhecer aspectos importantes das escolas que inspecionam e são considerados por seus atores como visitantes esporádicos. A orientação e a fiscalização implicadas pelo serviço de inspeção requerem um conhecimento da escola bem mais profundo do que aquele que é normalmente estabelecido.
Vivendo, na rotina diária, relações de um poder simbólico, tais atores são envolvidos, em determinados momentos críticos, em disputas por cargos de poder e lutas por imposição de idéias, pelas quais mobilizam os recursos de que dispõem e vêem cair o véu do poder simbólico, que cede lugar ao embate, quase sempre desgastante. Estes momentos, apesar de muitas vezes representarem um alto custo para a Instituição e seus atores, são inerentes às relações de poder e fazem, inevitavelmente, avançar o universal, como afirma Bourdieu.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOURDIEU, Pierre. La noblesse d’État: grandes écoles et esprit de corps. Paris: Minuit, 1989. 569p. [ Links ]
CASTRO, Magali de. Relações de poder na escola pública de ensino fundamental: uma radiografia à luz de Weber e Bourdieu. São Paulo, 1994. Tese (Doutorado) – Universidade de São Paulo, 325p. [ Links ]
CASTRO, Magali de. Contribuições da sociologia clássica e contemporânea para a análise das relações de poder na escola: um estudo do poder em Weber e em Bourdieu. Educação e sociedade, Campinas, v.16, n.50, p.105-43, abr. 1995. [ Links ]
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